Lixo, resíduo, rejeito
Popularmente aceito, o termo lixo é tecnicamente incorreto
Lixo é algo indesejável, que já não tem serventia para quem o descarta. Mas, como o mundo é complexo, o que não serve para mim, pode servir para outros.
Conhecer as diferenças entre os termos ajuda-nos a entender a lógica dos resíduos.
O historiador inglês Peter Burke entende que “lixo é simplesmente material no lugar errado”. Segundo ele, podemos compreender a história do lixo partindo do exame sobre as mudanças dos procedimentos de descarte destes materiais.
Material resultante do consumo, produção e prestação de serviços pode ser considerado resíduo ou rejeito. De qualquer forma, precisa ser separado, acondicionado, coletado e destinado corretamente.
A depender da composição e do local de geração - comércios, indústrias, hospitais ou domicílios - estes materiais podem passar por compostagem - como os orgânicos - reciclagem, reutilização, tratamento para eliminação da periculosidade - como os resíduos perigosos - ou serem destinados à aterro sanitário licenciado. Estas regras e organização constam na Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS, 2010).
No uso popular, lixo é algo indesejável, que já não tem serventia para quem o descarta. Mas, como o mundo é complexo, o que não serve para mim, pode servir para outras pessoas. Portanto, o termo lixo é um equívoco.
Robério Cabral da Silva, do Centro de Informação Tecnológica e para Negócios da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), informa que não há definição para o termo “lixo” nas Normas Técnicas da ABNT. A Política Nacional de Resíduos Sólidos também não define o conceito de lixo.
Ou seja, apesar de o termo lixo ser popularmente aceito, tecnicamente não é adequado.
A NBR 7501:2020, item 2.177, define resíduos como “materiais resultantes de atividades da comunidade de origem: industrial, hospitalar, comercial, agrícola, de serviços e de varrição". Rejeito é compreendido pela NBR 13028:2017, item 3.1, no sentido da mineração: "Todo e qualquer material descartado durante o processo de beneficiamento de minérios".
Caroline Beutler, Engenheira Ambiental e Sanitarista do Grupo Servioeste, ajuda-nos a entender a lógica dos resíduos. Acompanhe a entrevista.
Qual a diferença entre lixo, resíduo e rejeito?
A principal legislação que temos sobre o assunto é a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), estabelecida pela Lei 12.305/2010. A partir dela, fica clara a definição entre resíduo e rejeito.
Podemos compreender resíduo como material que ainda pode ser utilizado como matéria-prima em outro processo, seja tratamento, reciclagem, reutilização e afins. Esse material ainda tem um valor econômico, ainda há alternativas de destinação final a ele.
Rejeito é aquele material que já não tem outra opção de tratamento, reciclagem, reutilização ou afim. Não há outra possibilidade, a não ser encaminhá-lo para disposição final em aterro. Rejeito é o que seria mais próximo daquilo que chamamos de “lixo”.
A Política Nacional de Resíduos Sólidos (Art. 3º) entende por rejeito os “resíduos sólidos que, depois de esgotadas todas as possibilidades de tratamento e recuperação por processos tecnológicos disponíveis e economicamente viáveis, não apresentem outra possibilidade que não a disposição final ambientalmente adequada.” E por resíduo o “material, substância, objeto ou bem descartado resultante de atividades humanas em sociedade, a cuja destinação final se procede, se propõe proceder ou se está obrigado a proceder, nos estados sólido ou semissólido, bem como gases contidos em recipientes e líquidos cujas particularidades tornem inviável o seu lançamento na rede pública de esgotos ou em corpos d’água, ou exijam para isso soluções técnica ou economicamente inviáveis em face da melhor tecnologia disponível.”
Qual a importância social do uso correto dos termos lixo, resíduo e rejeito?
É importante mudarmos o pensamento de que todo material que geramos é “lixo”. A sociedade entende “lixo” como aquilo que não serve mais, que não presta, é inútil. E geralmente as pessoas querem o “lixo” longe. Entretanto, a maioria dos materiais gerados por nossas atividades são, na verdade, resíduos com um valor de mercado enorme e com uma possibilidade de destinações muito grande. Não é inútil, geram muitos empregos e renda e servem para muitas utilidades. A partir do momento em que todos enxergarem esse material como verdadeiro MATERIAL, talvez o modo como o descartamos também mude.
Por que nem todo material pode ser reciclado ou reutilizado?
Atualmente, existem tecnologias de reciclagem para a maioria dos materiais existentes (talvez todos). Muitos não são reciclados pois chegam a associações de reciclagem em más condições de armazenamento - chegam sujos, contaminados devido ao descarte inadequado dos materiais, o que faz muitos resíduos virarem rejeitos.
Se não pode ser reciclado nem tratado, para onde vai? Qual o destino correto?
Quando um material não pode ser encaminhado para reciclagem, em função das más condições em que se encontra (sujo, contaminado), infelizmente, o único destino para ele é a disposição final em aterro sanitário.
Os resíduos de saúde, por exemplo, são considerados perigosos e devem ser encaminhados para tratamento (autoclavagem ou incineração). Eles têm um valor econômico, ele ainda será matéria prima de um outro processo (de tratamento). Portanto, eu tenho ainda uma opção de destino a ele. OU seja, ELE NÃO É UM REJEITO. Agora, após o tratamento, quando realmente todas as possibilidades são esgotadas, quando vou enviá-lo ao aterro, aí sim, ele torna-se um rejeito.
Os termos resíduo de saúde e resíduo hospitalar são equivalentes?
Não são equivalentes. A RDC 222/2018 estabelece que resíduos de saúde são todos os resíduos gerados em estabelecimentos de saúde, portanto, podem ser postos de saúde, laboratórios, universidades, farmácias, clínicas médicas e veterinárias, estéticas, salões de beleza, hospitais, etc.
Os resíduos de saúde são materiais provenientes de procedimentos cirúrgicos, atendimentos clínicos, exames laboratoriais, pesquisas científicas, etc, que tenham entrado em contato com sangue e/ou secreção do paciente ou de animais e, portanto, apresentam potencial risco à saúde humana ou ao meio ambiente.
Quando se fala resíduo hospitalar, a referência é exclusiva aos resíduos gerados em hospitais, que podem ser orgânicos, recicláveis ou de saúde (resíduos perigosos), por exemplo, e cada um deles deve passar por processo ou tratamento específico. Portanto, é incorreto utilizar os termos resíduos de saúde e resíduo hospitalar como sinônimos.
Quais as obrigações de quem gera resíduo ou rejeito?
Quem gera um resíduo deve responsabilizar-se por ele para evitar danos ambientais. Separar de maneira correta o “lixo doméstico” (orgânico, plástico, vidro, papel) e os diferentes tipos de resíduos (de saúde, comercial, industriais), é o início da cadeia de gestão de resíduos, além de ser fundamental para preservação da vida.
A Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei 12.305/2010) define que os geradores (empresas, indústrias, cidadãos) são responsáveis pelos resíduos decorrentes do processo produtivo ou do consumo.
A responsabilidade em dar um destino correto ao resíduo gerado é sempre de quem o gera, seja uma indústria, um comércio, um prestador de serviços e mesmo uma pessoa física.
É dever do cidadão e de todo empresário responsabilizar-se pelo resíduo que produz. É o que diz a Lei Federal 12.305/2010.